De certeza que alguém está já a preparar o próximo ano lectivo e o Primeiro-Ministro trouxe hoje duas mensagens-chave sobre ele: será em convivência com a Covid19 e obrigará as escolas a uma adaptação de grande dimensão.
A escola pública não pode transferir-se para casa sob pena de passar de mitigadora a produtora de desigualdades. Não é apenas, embora também seja, a exclusão digital de alguns alunos e famílias ou os problemas tecnológicos com internet, computadores, tablets e telemóveis, gerando uma nova deisgualdade de acesso à educação. Nesse campo, aliás, muitas autarquias estão a fazer um esforço notável. É também a compressão da relação pedagógica que retira na educação a distância muita interação com os alunos, tende a reduzir-se para já à transmissão unilateral de conhecimentos, aumenta a dependência dos pais para os apoios educativos e por isso amplia as desigualdades de oportunidades de sucesso entre crianças e jovens de famílias de diferentes meios sociais. A escola em casa devolve às famílias uma centralidade educativa que aprofunda desigualdades, como bem salientou o Rui Pena Pires .
Sabendo que se espera que tenhamos que conviver com a Covid19 mais dois anos, não podemos continuar em clima de improviso e dependentes da capacidade de adaptação individual de cada professor e de cada família. Como as escolas não vão aparecer do chão como cogumelos e parece claro que terá que haver menos alunos por sala, redução da frequência de espaços coletivos como as cantinas, horários adaptador a que não haja congestionamento de transportes públicos, assim como haverá professores de grupos de risco que não poderão dar aulas presenciais, não é difícil imaginar que a solução que permita não condenar esta geração à falta de acesso à escola de que necessita vai exigir muito trabalho.
Acresce que temos que nos preparar para períodos de novos confinamentos, com a chegada de novas ondas da pandemia. Há mesmo modelos que antecipam um cenário em que a onda do próximo inverno será mais ampla do que a que já vivemos.
Quem está a preparar os próximos dois anos lectivos está seguramente a pensar nisso. Mas não consigo imaginar que tenhamos sucesso sem novos programas de formação contínua de professores para o desenvolvimento de materiais pedagógicos, para o uso das plataformas e adaptação pedagógica a formação a distância e para a interação pedagógica em formas de ensino blended como as que muito provavelmente nos esperam. Como não consigo acreditar que as escolas possam receber a mesma quantidade de alunos com a mesma carga horária que têm nos curricula atuais. Nem acho, pelo que vejo e ouço, que o improviso atual possa continuar ou esteja a permitir globalmente atingir padrões de qualidade e democraticidade que garantam o cumprimento da missão da escola pública. Teria preferido que se assumisse este trimestre de um modo diferente (ver http://paulopedroso.blogspot.com/2020/05/para-que-uma-emergencia-de-saude-nao-se.html), mas essa questão está ultrapassada.
Não invejo o trabalho de quem está a pensar a escola pública nos próximos dois anos e não transformo a minha ignorância do que esteja a ser feito numa crítica a uma inércia que provavelmente não existe. Posso achar que já se devia saber mais sobre o próximo ano lectivo, contudo, porque a participação é um fator de sucesso em política educativa e para que nos possamos preparar. E continuo convencido que as medidas de planeamento das alterações necessárias não podem circunscrever-se à adaptação de espaços e de reforço das capacidades tecnológicas. Ou seja, espero que os recursos pedagógicos necessários estejam a ser preparados e imagino que as ações de formação necessárias estão na forja.
Ao contrário do que possa parecer, não é cedo para saber que escola pública vai esperar os alunos em setembro e parece-me que todos compreenderão que é uma questão pelo menos de tanta relevância como a da medição das distâncias nos restaurantes. Assim como acredito que compreenderão que não é compatível com declarações de intenções tão do outro mundo como a de definir regras que pressupõem que crianças em creche podem estar lá um dia inteiro sem partilhar brinquedos ou se tocar. É preciso tanta imaginação quanto realismo e nem os peritos da saúde não podem ser prescritorss de medidas inexequíveis nem os da educação podem ignorar que a Covid19 estará connosco por tempo suficiente para se poder tratar o desafio com meros ajustes nas infra-estruturas, distribuição de computadores e fitas adesivas nos pavimentos e nas mesas.
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