Os EUA podem ter sido um líder do mundo ocidental e das democracias liberais de que se gostava ou não. Mas hoje declararam de modo expresso e na primeira pessoa que renunciam a algo parecido com ser tal coisa.
A declaração da Casa Branca sobre a sua relação com a Arábia Saudita é a prova definitiva da visão presidencial sobre os interesses nacionais dos americanos. Nem compromisso com a segurança global, nem envolvimento com regulação multilateral, nem defesa de quaisquer valores tidos como fundamentais. Tudo é trocado por uma visão do comercio internacional assente num jogo de soma nula. Apenas interesse comercial, no caso, no comércio de armamento e uma definição lapidar da sua visão do mundo, America First! Sem margem para dúvidas.
20.11.18
18.11.18
A excitação do IVA das touradas
O PS anda dividido e o país político exaltado com o IVA da tourada. Uns dizem que é uma questão de civilização. Outros, que é uma questão de liberdade. Mas não alcanço como pensam assim uns e outros. Aceitamos a barbárie, cara amiga e Ministra, se pagar 13% ou mesmo 23% de IVA em vez de 6%? Não somos livres hoje, caro amigo e camarada Manuel Alegre, porque não paga taxa mínima ou deixamos de o ser amanhã se pagar mais que outros espetáculos?
Os exageros retóricos fazem parte da luta política, mas estes roçam o patético. Indiscutivelmente, o governo quer diferenciar a tourada face a outros espectaculos e, sem dúvida, alguns querem proteger este espectáculo, tornando-o mais acessível aos consumidores. Posições ambas legítimas.
Na verdade, foi o Governo que levou a questão para um terreno a meu ver errado. Preferia que tivesse havido um discurso que assentasse na defesa dos espectáculos cujo IVA se reduz, assumindo que não se quer promover a tourada - e haveria muitas razões para o fazer - do que no ataque àquele cuja taxa se mantém, criando em torno do IVA uma batalha política sobre valores fundamentais e uma tempestade desnecessária. Há diferenciação de taxas de IVA entre bebidas alcoólicas, porque não entre espectáculos? O IVA não se diferencia só nem sobretudo por gosto e por debate civilizacional, diferencia-se por opção política.
Se fosse deputado votava ao lado do Governo, porque não entendo que haja motivo para proteger este espetáculo na lista de bens essenciais. Mas também viveria bem com uma discordância sobre a taxa de IVA de um certo serviço. Aliás, a tabela de IVA está cheia de sinais contraditórios e inconsistentes, de acordo com a capacidade de afirmação de grupos de interesses em cada momento.
Se o grupo de interesse da tourada ganhar a batalha do IVA não vejo a barbárie a avançar e se a perder não vejo a liberdade ameaçada. Mas parece que não acompanho a visão de longo alcance dos nosssos melhores pensadores.
Estou pronto a defender o direito de ir à tourada, sem ser aficionado e para me opor a que a proibam, por uma questão de liberdade. Mas também para dizer que não vejo porque há-de beneficiar da taxa de IVA reduzida.
Os exageros retóricos fazem parte da luta política, mas estes roçam o patético. Indiscutivelmente, o governo quer diferenciar a tourada face a outros espectaculos e, sem dúvida, alguns querem proteger este espectáculo, tornando-o mais acessível aos consumidores. Posições ambas legítimas.
Na verdade, foi o Governo que levou a questão para um terreno a meu ver errado. Preferia que tivesse havido um discurso que assentasse na defesa dos espectáculos cujo IVA se reduz, assumindo que não se quer promover a tourada - e haveria muitas razões para o fazer - do que no ataque àquele cuja taxa se mantém, criando em torno do IVA uma batalha política sobre valores fundamentais e uma tempestade desnecessária. Há diferenciação de taxas de IVA entre bebidas alcoólicas, porque não entre espectáculos? O IVA não se diferencia só nem sobretudo por gosto e por debate civilizacional, diferencia-se por opção política.
Se fosse deputado votava ao lado do Governo, porque não entendo que haja motivo para proteger este espetáculo na lista de bens essenciais. Mas também viveria bem com uma discordância sobre a taxa de IVA de um certo serviço. Aliás, a tabela de IVA está cheia de sinais contraditórios e inconsistentes, de acordo com a capacidade de afirmação de grupos de interesses em cada momento.
Se o grupo de interesse da tourada ganhar a batalha do IVA não vejo a barbárie a avançar e se a perder não vejo a liberdade ameaçada. Mas parece que não acompanho a visão de longo alcance dos nosssos melhores pensadores.
Estou pronto a defender o direito de ir à tourada, sem ser aficionado e para me opor a que a proibam, por uma questão de liberdade. Mas também para dizer que não vejo porque há-de beneficiar da taxa de IVA reduzida.
26.10.18
As memórias e o erro fatal de Cavaco Silva
Ao contrário de outros, nada me incomoda que Cavaco Silva escreva memórias. Acho este estilo literário interessante, aliás. Ele tem razão, quando acha que é um exercício banal de grandes estadistas. Mas, se a profundeza das suas análises está fielmente retratada nas notícias que vão saindo sobre o conteúdo, parece que as dele expõem mais um amador da psicologia dos livros de auto-ajuda, obcecado com comportamentos situacionais e tiques dos interlocutores, em que sobressaem a auto-confianca ou a humildade,do que um homem de Estado, capaz de perceber e interpretar grandes desígnios e prever e antecipar caminhos.
Se a leitura confirmar a primeira impressão, obtida dos excertos dos media, então as memórias de Cavaco caem na categoria de observações triviais de homens de estado banais. Farão as delícias dos pescadores de fofoca e nada acrescentarão de relevante aos que quiserem interpretar o momento histórico em que foram produzidas.
Mas a entrevista em que Cavaco Silva diz que não se apercebeu de quanto o entendimento político PS, BE e PCP era viável, vale por tudo o que ele possa escrever sobre a interpretação do que se estava a passar. António Costa tinha anunciado o fim do arco da governação há muito, Catarina Martins e Jerónimo de Sousa tinham dito em plena campanha que as divergências não impediam a construção de alternativas. Costa tinha anunciado que não se comprometia com a viabilização de um orçamento minoritário do PSD-CDS. Cavaco não acreditou em nada disto é não percebeu o que significava? . Devia estar fixado a interpretar um vinco no rosto ou um sorriso estranho no rosto das personagens que faziam tais afirmações políticas. E isso impediu-o de ver o que de facto estava a acontecer.
Se alguma coisa tem importância histórica no que já sei sobre estas memórias é que o erro fatal de Cavaco demonstra a sua incapacidade de leitura política. Fica a curiosidade, uma pergunta às memórias, que espero ver respondida quando as ler ou em alguma entrevista complementar ao memorialista: a sua casa civil sabia de como evoluía a esquerda? Informou-o, enganou-o ou foi mantida na ignorância? Escondeu, mentiu ou não era capaz de fazer o seu trabalho na ligação aos partidos? E os políticos com quem falou, mentiram-lhe ou ele achou que sabia melhor que eles o que eles defendiam para Portugal naquele momento? O que dirá a resposta a estas perguntas do Presidente e de quem com ele trabalhava?
A Cavaco pode interessar muito a auto-confiança de António Costa, eu tenho curiosidade pelo erro fatal de Cavaco, que precipitou, felizmente, a possibilidade de uma convergência de esquerda que correspondeu ao sentido político do voto dos portugueses, como alguns viram logo e a posteriori se verifica com facilidade.
Se a leitura confirmar a primeira impressão, obtida dos excertos dos media, então as memórias de Cavaco caem na categoria de observações triviais de homens de estado banais. Farão as delícias dos pescadores de fofoca e nada acrescentarão de relevante aos que quiserem interpretar o momento histórico em que foram produzidas.
Mas a entrevista em que Cavaco Silva diz que não se apercebeu de quanto o entendimento político PS, BE e PCP era viável, vale por tudo o que ele possa escrever sobre a interpretação do que se estava a passar. António Costa tinha anunciado o fim do arco da governação há muito, Catarina Martins e Jerónimo de Sousa tinham dito em plena campanha que as divergências não impediam a construção de alternativas. Costa tinha anunciado que não se comprometia com a viabilização de um orçamento minoritário do PSD-CDS. Cavaco não acreditou em nada disto é não percebeu o que significava? . Devia estar fixado a interpretar um vinco no rosto ou um sorriso estranho no rosto das personagens que faziam tais afirmações políticas. E isso impediu-o de ver o que de facto estava a acontecer.
Se alguma coisa tem importância histórica no que já sei sobre estas memórias é que o erro fatal de Cavaco demonstra a sua incapacidade de leitura política. Fica a curiosidade, uma pergunta às memórias, que espero ver respondida quando as ler ou em alguma entrevista complementar ao memorialista: a sua casa civil sabia de como evoluía a esquerda? Informou-o, enganou-o ou foi mantida na ignorância? Escondeu, mentiu ou não era capaz de fazer o seu trabalho na ligação aos partidos? E os políticos com quem falou, mentiram-lhe ou ele achou que sabia melhor que eles o que eles defendiam para Portugal naquele momento? O que dirá a resposta a estas perguntas do Presidente e de quem com ele trabalhava?
A Cavaco pode interessar muito a auto-confiança de António Costa, eu tenho curiosidade pelo erro fatal de Cavaco, que precipitou, felizmente, a possibilidade de uma convergência de esquerda que correspondeu ao sentido político do voto dos portugueses, como alguns viram logo e a posteriori se verifica com facilidade.
25.9.18
Os problemas do círculo entre os fala-barato e jornalismo de orelha a teclado
É boa prática esta de O Observador reconhecer que errou. Mas a devolução que faz da responsabilidade pelo erro para as suas fontes, levanta questões. Atente-se na frase seguinte: as fontes “várias, judiciais e políticas, todas elas bem colocadas (...) falaram ao Observador de boa fé. Simplesmente, julgavam ser portadoras de informações que não conheciam na totalidade.”
É bonito que o jornalista seja simpático para com as suas fontes “de boa fé”, ao mesmo tempo que lhes denuncia a leviandade.
Esta confissão é um retrato de um problema importante a afetar fontes e jornalistas. Num círculo de fala-barato e jornalismo de orelha a teclado, a verdade é muitas vezes prejudicada. Com esse círculo vicioso não saem prejudicados só os profissionais e os visados. Saem também os jornalistas, a justiça e a própria democracia.
14.9.18
Este cartaz é fabuloso. Não falo de política, mas de marketing.
Este cartaz é fabuloso. Não falo de política, mas de marketing.
Não deve haver coisa mais difícil de concretizar na linguagem das mensagens simples do que a estratégia do PT para as presidenciais, que assenta na ideia de que o candidato de facto não é o candidato real e de que a política pode dar felicidade a um povo.
Lula preso? Ele ri.
Haddad candidato? Ocupa apenas o segundo plano.
Manuela? A pessoa em primeiro plano nem é do PT!
À direita tentou apropriar-se das cores do Brasil? Este cartaz é vermelho da luta e azul e cinzento como o horizonte (e podia ser para qualquer país).
As eleições são para o Presidente? Quase não se dá por ela. Agora o que interessa é que saibam que Haddad é Lula, seja lá o Haddad quem for.
Mas aqui tudo isso parece natural e, mais que isso, óbvio.
Quantas palavras tem o cartaz para além dos nomes? Presidente, é e com.
Preparem-se, seja lá quem for o marqueteiro, vem aí uma campanha milimétrica do PT.
15.8.18
O RSI ainda vale mais pelo que vier a ser
Foi mesmo uma causa de vida e para a vida. Agora, felizmente, é só mais uma medida. Ainda continua a ser a peça que faltava na luta contra a pobreza e podia ser uma peça um pouco mais forte, com um pouco mais de atenção e menos de burocratização, um pouco mais de serviço social e de recursos para a inclusão, mesmo que não fosse possível subir o baixíssimo valor da prestação.
No dia em que o RSI for só uma transferência monetária perde parte importante da sua identidade e no dia em que se reduzir a uma prestação condicionada à procura de emprego, passa a ser o contrário daquilo para que nasceu, workfare em vez de Estado social activo.
Mas há algo sobre o que vale a pena reflectir especialmente. A maior incidência da pobreza está a transferir-se para as crianças e jovens e seus pais, portanto para um grupo etário em que o RSI e as prestações familiares são as grandes respostas atuais e estão ambas a fraquejar no combate à pobreza, mesmo à pobreza extrema.
É tempo de refletir sobre a resposta a dar às novas configurações da pobreza e sobre como manter atuais os objetivos de libertar as pessoas da necessidade material e aumentar a sua liberdade, o seu direito a participar amplamente na nossa sociedade, prevenindo a transmissão intergeracional da pobreza.
Ainda é o tempo em que a melhor forma de se celebrar o que se conseguiu é olhando essencialmente para o que está por fazer.
https://www.publico.pt/2018/08/15/politica/noticia/paulo-pedroso-o-rendimento-minimo-ou-a-causa-mais-nobre-de-reducao-da-pobreza-1841035
9.7.18
12.6.18
Ponto final, finalmente.
Ponto final, finalmente, no processo em que fui envolvido erradamente e tratado em certos momentos de modo ilegal, injusto e atentatório dos direitos humanos.
Disse em maio de 2003 que acreditava na justiça e continuo a acreditar. Mas a minha crença hoje é mais informada, mais exigente e feita da percepção vivida das suas qualidades e dos seus defeitos.
Fiz tudo o que estava ao meu alcance na busca da verdade e do direito a um processo justo, em todas as suas fases. Porque só a verdade e a justiça protegem todas as partes em presença e a sociedade da arbitrariedade.
A acusação monstruosa que me foi feita foi demolida por um tribunal português. A prisão ilegal a que fui submetido foi revogada por um tribunal português. A reparação pelos erros cometidos por certos operadores judiciários portugueses foi agora decidida pelo tribunal europeu dos direitos humanos.
Fui vitima de erros judiciários graves e grosseiros. Como a justiça é uma obra humana não estará nunca imune a esses erros. Mas o sistema de justiça tem o dever de se organizar para que não ocorram, prevenindo-os, bem como de ser capaz de os reconhecer rapidamente e reparar na medida do possível.
Quem errou, intencionalmente ou por negligência, soube hoje que saiu derrotada neste processo a sua visão autoritária do processo penal. Assim como saiu derrotada a visão corporativa da protecção dos pares em relação aos erros graves por si cometidos. E saiu derrotada a visão perversa do processo penal, baseada no abuso da ocultação de provas e na manipulação mediática de processos judiciais.
Tenho também a certeza que há na justiça portuguesa, em todos os operadores judiciários, muitas pessoas que dedicam a sua vida a uma justiça melhor, mais eficaz e mais justa.
No fim de um processo em que há ilegalidades e violação de direitos humanos ninguém vence porque os danos causados são irreparáveis. Mas a sentença de hoje determina que no fim deste processo há um vencedor, um único, a confiança na justiça e a esperança de que ela melhore, amparada no reconhecimento de direitos, liberdades e garantias, na Constituição da República, na Convenção Europeia dos Direitos Humanos, os instrumentos que se impuseram, no fim de tudo, e que impediram que tivesse ficado impune o gravíssimo erro de que fui vitima.
Só hoje voltei verdadeiramente a ser livre. Espero que a perseverança destes quinze anos possa ajudar a que outros não passem por nada idêntico e, sobretudo, se passarem, a terem sempre a esperança de que a liberdade não morre enquanto houver respeito pelos direitos humanos e instituições que garantam e imponham esse respeito.
Disse em maio de 2003 que acreditava na justiça e continuo a acreditar. Mas a minha crença hoje é mais informada, mais exigente e feita da percepção vivida das suas qualidades e dos seus defeitos.
Fiz tudo o que estava ao meu alcance na busca da verdade e do direito a um processo justo, em todas as suas fases. Porque só a verdade e a justiça protegem todas as partes em presença e a sociedade da arbitrariedade.
A acusação monstruosa que me foi feita foi demolida por um tribunal português. A prisão ilegal a que fui submetido foi revogada por um tribunal português. A reparação pelos erros cometidos por certos operadores judiciários portugueses foi agora decidida pelo tribunal europeu dos direitos humanos.
Fui vitima de erros judiciários graves e grosseiros. Como a justiça é uma obra humana não estará nunca imune a esses erros. Mas o sistema de justiça tem o dever de se organizar para que não ocorram, prevenindo-os, bem como de ser capaz de os reconhecer rapidamente e reparar na medida do possível.
Quem errou, intencionalmente ou por negligência, soube hoje que saiu derrotada neste processo a sua visão autoritária do processo penal. Assim como saiu derrotada a visão corporativa da protecção dos pares em relação aos erros graves por si cometidos. E saiu derrotada a visão perversa do processo penal, baseada no abuso da ocultação de provas e na manipulação mediática de processos judiciais.
Tenho também a certeza que há na justiça portuguesa, em todos os operadores judiciários, muitas pessoas que dedicam a sua vida a uma justiça melhor, mais eficaz e mais justa.
No fim de um processo em que há ilegalidades e violação de direitos humanos ninguém vence porque os danos causados são irreparáveis. Mas a sentença de hoje determina que no fim deste processo há um vencedor, um único, a confiança na justiça e a esperança de que ela melhore, amparada no reconhecimento de direitos, liberdades e garantias, na Constituição da República, na Convenção Europeia dos Direitos Humanos, os instrumentos que se impuseram, no fim de tudo, e que impediram que tivesse ficado impune o gravíssimo erro de que fui vitima.
Só hoje voltei verdadeiramente a ser livre. Espero que a perseverança destes quinze anos possa ajudar a que outros não passem por nada idêntico e, sobretudo, se passarem, a terem sempre a esperança de que a liberdade não morre enquanto houver respeito pelos direitos humanos e instituições que garantam e imponham esse respeito.
31.5.18
Banco de horas, flexibilidade e democracia laboral
Leio que a OCDE preferia que Portugal mantivesse os bancos de horas no contexto da individualização das relações laborais, ou, seja por relação direta entre a empresa e cada trabalhador individualmente considerado e que abandonar esta prática prejudicaria o emprego.
O racional deste discurso é antiquíssimo e é o de que permitir que os trabalhadores possam agir coletivamente prejudica, por natureza, a economia e o emprego. Está longe de estar demonstrado que o modelo da individualização das relações de trabalho tenha superioridade económica sobre o respeito e investimento nas relações colectivas. Há mesmo uma escola de pensamento na economia política que foca as duas eficiências contrastantes no capitalismo contemporâneo entre a versão liberal (a que a OCDE adere neste caso) e a versão coordenada. O ponto de partida não é económico, é ideológico.
Mas também é verdade que as relações colectivas de trabalho podem ter resultados contrastantes. Tanto podem ser bem sucedidas, gerando modelos de corresponsabilidade pela sustentatibilidade económica das empresas e setores de actividade, como gerar desastres coletivos, apressando suicidios empresariais e pondo em risco actividades económicas. A opção de ligar os bancos de horas a decisões coletivas corre esse risco democrático que se manifesta em tantas esferas da vida.
No modo como entendo a questão, não há qualquer superioridade económica do modelo liberal de flexibilidade horária que implica a existência de bancos de horas de adesão individual, apenas o cerceamento de direitos dos trabalhadores e o enfraquecimento da sua posição nas empresas. Logo, a OCDE não tem razão. Mas, para que os profetas liberais que odeiam os direitos colectivos dos trabalhadores não vejam a realidade dar-lhes uma razão que não têm no plano das ideias, é necessário que os trabalhadores colectivamente organizados, nas empresas e nos sindicatos, ajam com a inteligência táctica que os trabalhadores merecem.
A experiência portuguesa neste campo é, aliás, francamente positiva. São, para além dos combates retóricos e mediáticos, muito mais os casos de sucesso na construção de situações positivas para as empresas e os trabalhadores pela ação colectiva do que o inverso. E, em Portugal, os trabalhadores coletivamente organizados, têm poder real de menos nas empresas e não demais. Que a lei estimule, como parece que vai fazer no espírito do acordo assinado na concertação social, a voz colectiva dos trabalhadores é um avanço e não um recuo.
Se isso não agrada às vozes que gostariam de fazer desaparecer os direitos colectivos dos trabalhadores, é um problema político. Os adversários, às vezes há que convencê-los, outras vezes que vencê-los simplesmente.
O racional deste discurso é antiquíssimo e é o de que permitir que os trabalhadores possam agir coletivamente prejudica, por natureza, a economia e o emprego. Está longe de estar demonstrado que o modelo da individualização das relações de trabalho tenha superioridade económica sobre o respeito e investimento nas relações colectivas. Há mesmo uma escola de pensamento na economia política que foca as duas eficiências contrastantes no capitalismo contemporâneo entre a versão liberal (a que a OCDE adere neste caso) e a versão coordenada. O ponto de partida não é económico, é ideológico.
Mas também é verdade que as relações colectivas de trabalho podem ter resultados contrastantes. Tanto podem ser bem sucedidas, gerando modelos de corresponsabilidade pela sustentatibilidade económica das empresas e setores de actividade, como gerar desastres coletivos, apressando suicidios empresariais e pondo em risco actividades económicas. A opção de ligar os bancos de horas a decisões coletivas corre esse risco democrático que se manifesta em tantas esferas da vida.
No modo como entendo a questão, não há qualquer superioridade económica do modelo liberal de flexibilidade horária que implica a existência de bancos de horas de adesão individual, apenas o cerceamento de direitos dos trabalhadores e o enfraquecimento da sua posição nas empresas. Logo, a OCDE não tem razão. Mas, para que os profetas liberais que odeiam os direitos colectivos dos trabalhadores não vejam a realidade dar-lhes uma razão que não têm no plano das ideias, é necessário que os trabalhadores colectivamente organizados, nas empresas e nos sindicatos, ajam com a inteligência táctica que os trabalhadores merecem.
A experiência portuguesa neste campo é, aliás, francamente positiva. São, para além dos combates retóricos e mediáticos, muito mais os casos de sucesso na construção de situações positivas para as empresas e os trabalhadores pela ação colectiva do que o inverso. E, em Portugal, os trabalhadores coletivamente organizados, têm poder real de menos nas empresas e não demais. Que a lei estimule, como parece que vai fazer no espírito do acordo assinado na concertação social, a voz colectiva dos trabalhadores é um avanço e não um recuo.
Se isso não agrada às vozes que gostariam de fazer desaparecer os direitos colectivos dos trabalhadores, é um problema político. Os adversários, às vezes há que convencê-los, outras vezes que vencê-los simplesmente.
27.5.18
A Itália vai provocar uma constipação de Verão à Europa?
A Europa vai acordar amanhã com uma crise. A Itália é a terceira maior economia do Euro e a recusa do Presidente da República em nomear um ministro anti-euro corresponde, no sistema político italiano, a fazer funcionar um poder que comporta grandes riscos.
Vista do exterior, a escolha do Presidente é justificada. Não é claro que a Itália tenha votado contra o euro no seu voto contra tanta coisa e é evidente que a turbulência económica que a nomeação geraria poria em risco os interesses de muitos eleitores.
Mas, como é fácil de entender pelos portugueses, a partir da sua própria experiência com as dissoluções do Parlamento pelos Presidentes, o uso dos poderes mais fortes, quase excepcionais, de um Presidente num sistema semi presidencialista implicam uma legitimidade derivada da sua ratificação a posteriori pelo eleitorado.
Se o acto do Presidente da República for entendido pelos partidos como apelo à permanência no Euro e der lugar a um governo diferente do que se desenhava sem eleições (muito improvável) e sobretudo se houver eleições antecipadas e os euro cépticos as não ganharem, os próximos meses verão o gesto de agora ratificado. Se no fim da linha a relação de forças se mantiver e o mesmo tipo de coligação e de políticas se impuser, a crise política italiana transforma-se muito provavelmente numa crise europeia com repercussões globais. A Itália não é um pequeno país periférico.
Mas já amanhã se pronunciará esse eleitor que não vota e dá pelo nome de mercados. Não sabemos o que fariam sem este gesto presidencial. Mas é bem provável que, mesmo com ele, acordem com dúvidas sobre o país e receios sobre o euro. É provável que a Europa sinta já e pelo menos uma constipação de Verão.
Vista do exterior, a escolha do Presidente é justificada. Não é claro que a Itália tenha votado contra o euro no seu voto contra tanta coisa e é evidente que a turbulência económica que a nomeação geraria poria em risco os interesses de muitos eleitores.
Mas, como é fácil de entender pelos portugueses, a partir da sua própria experiência com as dissoluções do Parlamento pelos Presidentes, o uso dos poderes mais fortes, quase excepcionais, de um Presidente num sistema semi presidencialista implicam uma legitimidade derivada da sua ratificação a posteriori pelo eleitorado.
Se o acto do Presidente da República for entendido pelos partidos como apelo à permanência no Euro e der lugar a um governo diferente do que se desenhava sem eleições (muito improvável) e sobretudo se houver eleições antecipadas e os euro cépticos as não ganharem, os próximos meses verão o gesto de agora ratificado. Se no fim da linha a relação de forças se mantiver e o mesmo tipo de coligação e de políticas se impuser, a crise política italiana transforma-se muito provavelmente numa crise europeia com repercussões globais. A Itália não é um pequeno país periférico.
Mas já amanhã se pronunciará esse eleitor que não vota e dá pelo nome de mercados. Não sabemos o que fariam sem este gesto presidencial. Mas é bem provável que, mesmo com ele, acordem com dúvidas sobre o país e receios sobre o euro. É provável que a Europa sinta já e pelo menos uma constipação de Verão.
23.4.18
O peso da pobreza
A primeira impressão do meu novo quotidiano é a inversão da relação entre o peso e a pobreza. Nas ruas de Washington D.C vê-se a relação inversa entre a quantidade de dólares na conta bancária e o peso. É estranha a sensação de sentir um país em que os pobres são arrastados para a obesidade. Mas, de facto, a comida mais barata aqui é a menos equilibrada. Para quem viu, por exemplo em Timor-Leste, a pobreza como subnutrição é difícil de encaixar a pobreza como sobrenutrição. Contudo, aqui ela move-se, nem sempre facilmente!
29.1.18
Rendimento básico incondicional - o meu ponto da situação
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