10.3.16

A Constituição, a economia, Cavaco e Marcelo

Na posse, um presidente deve focar-se na Constituição ou na economia? Se preferir a economia, reconhecer-se-á  no discurso da última tomada de posse de Cavaco Silva. Se der mais importância à Constituição gostará claramente mais da (primeira) posse de Marcelo Rebelo de Sousa.
Há cinco anos, Cavaco disse dezasseis vezes a palavra economia. Agora, Marcelo, apenas duas. Agora, Marcelo disse nove vezes a palavra Constituição. Há cinco anos, Cavaco pronunciou-a apenas uma.
A preocupação com a Constituição é o elemento diferenciador dos dois últimos discursos de posse e é, então, a principal novidade trazida ou pelo menos o elemento devolvido ao debate político pelo novo Presidente.
Se Marcelo conseguir ser o guardião da Constituição, conseguirá unir melhor o que Cavaco fez tudo para cindir e desencorajará os governos borderline no desrespeito da Constituição. Com isso, mudará o centro gravitacional da política portuguesa de novo para dentro do consenso constitucional de 1976, retirando-o de onde o Presidente Cavaco o deixou pôr, na tensão entre cumprir a constituição e governar o país. E foi essa deslocação do centro político para a fronteira da Constituição  que originou o aumento a que assistimos da centralidade do Tribunal Constitucional como ponto de veto no sistema político, em particular em resposta a iniciativas de deputados.
Se Marcelo fizer o caminho que o discurso de posse anuncia, ouviremos falar mais do Presidente e menos do Tribunal Constitucional nos próximos anos, teremos menos fiscalização da constitucionalidade por iniciativa dos deputados e mais por iniciativa do Presidente ou menos interpretações ousadas da Constituição pelos governos e menos fiscalizações da constitucionalidade.
Há, claro, ainda a hipótese alternativa de Marcelo querer fazer cumprir a Constituição, mas uma Constituição modificada e o pacto que propõe, a nova união, ser uma renovação do arco da governabilidade em torno de uma constituição revista profundamente. Mas, se essa ambição não contradiria o seu discurso, nada nele a anunciou e nada na atual dinâmica do sistema partidário faz prever que tivesse sucesso.

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