3.11.15

Há pressão excessiva sobre o acordo político à esquerda

Anda por aí uma onda de exigência desmedida sobre o primeiro entendimento político entre os partidos de esquerda em quarenta anos de democracia.
Ouço muitos amigos bem intencionados dizer-me "tem que resultar, senão é o fim da esquerda para décadas". Para não falar dos outros que exigem um acordo blindado para a legislatura como espécie de última esperança de que não venha a haver acordo nenhum.
É claro que quero e gostaria que um acordo político de esquerda durasse uma legislatura inteira. Mas não me reconheço nesta exigência acrescida que é uma forma reflexa de complexo de inferioridade do diálogo político à esquerda.
Tomemos os acordos políticos de direita, os únicos que verdadeiramente têm tradição, como primeiro exemplo de comparação. Com maioria absoluta no Parlamento, Francisco Pinto Balsemão não conseguiu levar a primeira AD ao fim da legislatura que começou em 1990. Marcelo Rebelo de Sousa, que formou a Segunda AD com Paulo Portas não conseguiu sequer levá-la até eleições, dissolvendo-a em vésperas de apresentação de listas ao Parlamento Europeu. Pedro Santana Lopes, que recebeu a coligação PSD-CDS de Durão Barroso, conseguiu afundar-se tanto num governo incompetente com Paulo Portas que depois de demitido por Jorge Sampaio levou a direita ao seu pior resultado eleitoral de sempre.
Ou seja, os entendimentos de direita só conseguiram acabar uma legislatura à quarta tentativa.
Para os que preferem o exemplo dos governos liderados do PS, a razão para ser superexigente com a coligação de esquerda também não é óbvia. Mário Soares não conseguiu acabar nenhuma legislatura como Primeiro-ministro. Na primeira caiu às mãos dos seus aliados do CDS e em 1985 por iniciativa da pressa de "ir ao pote" do novo líder do PSD, Cavaco Silva. António Guterres conseguiu acabar uma legislatura, mas caiu desgostoso com um resultado autárquico e incomodado com os orçamentos limianos. E José Sócrates sucumbiu em 2011 à tenás esquerda-direita a propósito do PEC IV. Em seis governos minoritários do PS ou de coligação deste com a direita, em cinco legislaturas, apenas um acabou a legislatura (o de 1995-1999).
Então porque é tão alta a pressão sobre o acordo que aí vem? Porque há muita gente com medo do que mudará se resultar.
Era bom que o governo durasse uma legislatura, mas o que é essencial é que governe bem e com as prioridades acertadas pelo tempo que governe. E, se falhar, que implique aprendizagem suficiente para que, tal como aconteceu com as outras fórmulas políticas, o próximo não repita os erros que se cometam agora.

1 comentário:

Anónimo disse...

Já tardava este entendimento.
Há responsabilidades do PS e do PCP neste muro criado à esquerda.
Mas, também, o interesse da direita e dos seus muchachos (grande, grande parte da comunicação social).