Vi e revi a notícia do Primeiro Jornal da SIC sobre o homicídio de Alcindo Monteiro, para ter a certeza que não estava a ser enviesado ou preconceituoso.
O alinhamento dos temas na notícia é o seguinte: Alcindo “cabo-verdiano com bilhete de identidade português”, nascido no Mindelo, que partilha a cor da pele com George Floyd, vítima de skinheads, foi encontrado morto em frente à loja de Gianni Versace, que seria ele próprio assassinado em sua casa por motivos desconhecidos, cumpriu o serviço militar em Beja e morreu longe da sua cidade-berço, Mindelo, onde nasceu numa altura em que a “a bandeira hasteada no país era a portuguesa” e termina “porque morreu Alcindo? É mais uma pergunta que fica sem resposta.”.
A intenção da notícia parece boa e começa por dar a informação relevante - um negro morreu às mãos de um grupo de skinheads - e fazer um paralelismo com George Floyd, mas a partida de que o homicídio ocorreu à porta de uma loja de marca para uma deambulação sobre o homicídio do magnate da alta costura nos EUA introduz uma inadmissível confusão de planos. A construção de uma relação de exterioridade de Alcindo com Portugal, no pormenor do bilhete de identidade e o eufemismo na referência a que nasceu durante o colonialismo, revelam uma portugalidade perturbada, que é incompreensível.
Poder-se-ia dizer que foram buscar Versace para ocupar tempo e encher a reportagem, mas faltou a quem escreveu a notícia o tempo necessário para dizer que o homicídio foi julgado e os culpados condenados. Têm nomes que a notícia omitiu. Mas, inaceitável mesmo, é que se termine com uma dúvida. Alcindo morreu de racismo. Não há nenhuma pergunta sem resposta neste caso.
Esta notícia merecia ser mostrada em cursos de jornalismo. Por tudo o que lá está a mais, tudo o que está ao lado e tudo o que falta.
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