23.7.19

Faleceu Li Peng

Faleceu Li Peng,  o homem que deu a ordem que conduziu ao massacre de Tiananmen. Na nossa espontânea forma individualista de olhar para a história, morreu o carniceiro da Praça da Paz Celestial.
Mas aproveitemos a ocasião para refletir um pouco sobre o que teria acontecido se o setor que Li Peng representou tivesse sido o derrotado e não o vitorioso. Naquele momento, o movimento dos estudantes só atingiu a expressão que teve e só durou o tempo que durou porque o Partido Comunista  tinha a sua cúpula dividida sobre o rumo a seguir. Se não estava em causa o caminho de liberalização  económica, estava em discussão a possibilidade de uma sociedade mais aberta, pluralista, respeitadora de direitos individuais e da liberdade de expressão de opiniões diferentes.
Provavelmente, se o espírito de Tiananmen tivesse triunfado e os seus aliados nas cúpulas do partido saído vencedores, pouco tinha mudado na abertura da economia ao mundo, na construção de uma economia com progressivos mecanismos de mercado, ainda que ferreamente controlados pelo Estado em alguns domínios muito relevantes.
O que teria sido diferente seria no domínio das liberdades individuais. O Partido Comunista  chinês teve nas mãos a oportunidade de tentar construir um modelo único de sociedade, que nenhum de nós sabe onde teria acabado. Com o caminho que escolheu, o colapso dos socialismos reais acabou por saldar-se por duas experiências, ambas hoje adversárias da democracia liberal. Na Rússia, um regime nacionalista, semipluralista e autoritário, com uma economia dominada por oligarcas, dependentes do círculo do líder. Na China, uma ditadura política que regula a sua economia progressivamente mais por mecanismos de mercado.
Se a China de hoje está integrada na globalização ao ponto de podermos ve-la a defender o sistema multilateral de comércio e as suas regras contra aqueles regimes que foram campeões da sua criação, em Tiananmen enterrou por muito tempo a possibilidade de um caminho para uma sociedade pluralista, respeitadora dos direitos humanos e aberta.
Por isso, a China pode ser um grande parceiro económico, um regime respeitado, mesmo um parceiro estratégico para resolver os problemas do mundo, mas um democrata não precisa de ser muito radical para entender que Tiananmen é um momento fundador do caminho da China após a queda da velha guerra entre dois blocos e que, nesse cruzamento da história, a China escolheu a ditadura.

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