31.5.18

Banco de horas, flexibilidade e democracia laboral

Leio que a OCDE preferia que Portugal mantivesse os bancos de horas no contexto da individualização das relações laborais, ou, seja por relação direta entre a empresa e cada trabalhador individualmente considerado e que abandonar esta prática prejudicaria o emprego.
O racional deste discurso é antiquíssimo e é o de que permitir que os trabalhadores possam agir coletivamente prejudica, por natureza, a economia e o emprego. Está longe de estar demonstrado que o modelo da individualização das relações de trabalho tenha superioridade económica sobre o respeito e investimento nas relações colectivas. Há mesmo uma escola de pensamento na economia política que foca as duas eficiências contrastantes no capitalismo contemporâneo entre a versão liberal (a que a OCDE adere neste caso) e a versão coordenada. O ponto de partida não é económico, é ideológico.
Mas também é verdade que as relações colectivas de trabalho podem ter resultados contrastantes. Tanto podem ser bem sucedidas, gerando modelos de corresponsabilidade pela sustentatibilidade económica das empresas e setores de actividade, como gerar desastres coletivos, apressando suicidios empresariais e pondo em risco actividades económicas. A opção de ligar os bancos de horas a decisões coletivas corre esse risco democrático que se manifesta em tantas esferas da vida.
No modo como entendo a questão, não há qualquer superioridade económica do modelo liberal de flexibilidade horária que implica a existência de bancos de horas de adesão individual, apenas o cerceamento de direitos dos trabalhadores e o enfraquecimento da sua posição nas empresas. Logo, a OCDE não tem razão. Mas, para que os profetas liberais que odeiam os direitos colectivos dos trabalhadores não vejam a realidade dar-lhes uma razão que não têm no plano das ideias, é necessário que os trabalhadores colectivamente organizados, nas empresas e nos sindicatos, ajam com a inteligência táctica que os trabalhadores merecem.
A experiência portuguesa neste campo é, aliás, francamente positiva. São, para além dos combates retóricos e mediáticos, muito mais os casos de sucesso na construção de situações positivas para as empresas e os trabalhadores pela ação colectiva do que o inverso. E, em Portugal, os trabalhadores coletivamente organizados, têm poder real de menos nas empresas e não demais. Que a lei estimule, como parece que vai fazer no espírito do acordo assinado na concertação social, a voz colectiva dos trabalhadores é um avanço e não um recuo.
Se isso não agrada às vozes que gostariam de fazer desaparecer os direitos colectivos dos trabalhadores, é um problema político. Os adversários, às vezes há que convencê-los, outras vezes que vencê-los simplesmente.

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