É certo que a história ensina que Mário Soares não só não agradeceu a não apresentação de um adversário como apressou, com as Presidências abertas de denúncia de vários problemas e desequilíbrios sociais, o enfraquecimento do PSD na última legislatura de Cavaco Silva. Mas, tudo visto e ponderado, o risco de não enfrentar Marcelo patrocinando uma candidatura é para o governo bastante menor do que o de se envolver na batalha presidencial.
Mas há dados novos na situação política portuguesa face a 1991 que merecem ser considerados por quem esteja menos focado no governo. Marcelo com o apoio explícito ou implícito de CDS, PSD e PS será a encarnação unipessoal do arco da governabilidade, algo que António Costa tinha pugnado por extinguir. Mais importante, se Marcelo for "o sistema", alimentará a fera populista, dando azo a que André Ventura possa expandir o elemento essencial do seu discurso, o de que é o que vem "de fora" em nome "do povo" contra "eles", que neste caso até estão convenientemente para si unidos a uma só voz e ninguém se surpreenda se nesse contexto triplicar ou quadruplicar o resultado do seu partido nas legislativas e se isso tiver algum efeito de arrastamento para eleições seguintes.
Finalmente, a esquerda democrática terá que escolher entre Marcelo e candidatos com agenda partidária, emanados do BE e do PCP, se não quiser votar com os pés, ficando em casa Perante isto, os sociais-democratas, socialistas democráticos, ecologistas de esquerda que priorizem o seu espaço político sobre as conveniências imediatas de partidos ou governos, os ativistas de diferentes causas sociais, incluindo as sindicais, teriam muito a ganhar em assumir uma candidatura-travão do populismo, mas também de criação de dificuldades ao regresso do arco da governabilidade, uma candidatura de alternativa a que o centro de gravidade do sistema político deslize para a direita, centrado num Marcelo reforçado, depois da estrondosa derrota que esta teve nas eleições legislativas.
Leia todo o artigo que desenvolve esta minha posição no DN.
https://www.dn.pt/opiniao/opiniao-dn/paulo-pedroso/presidenciais-ha-lugar-a-esquerda-para-uma-underdog-11819178.html