Ponto final, finalmente, no processo em que fui envolvido erradamente e tratado em certos momentos de modo ilegal, injusto e atentatório dos direitos humanos.
Disse em maio de 2003 que acreditava na justiça e continuo a acreditar. Mas a minha crença hoje é mais informada, mais exigente e feita da percepção vivida das suas qualidades e dos seus defeitos.
Fiz tudo o que estava ao meu alcance na busca da verdade e do direito a um processo justo, em todas as suas fases. Porque só a verdade e a justiça protegem todas as partes em presença e a sociedade da arbitrariedade.
A acusação monstruosa que me foi feita foi demolida por um tribunal português. A prisão ilegal a que fui submetido foi revogada por um tribunal português. A reparação pelos erros cometidos por certos operadores judiciários portugueses foi agora decidida pelo tribunal europeu dos direitos humanos.
Fui vitima de erros judiciários graves e grosseiros. Como a justiça é uma obra humana não estará nunca imune a esses erros. Mas o sistema de justiça tem o dever de se organizar para que não ocorram, prevenindo-os, bem como de ser capaz de os reconhecer rapidamente e reparar na medida do possível.
Quem errou, intencionalmente ou por negligência, soube hoje que saiu derrotada neste processo a sua visão autoritária do processo penal. Assim como saiu derrotada a visão corporativa da protecção dos pares em relação aos erros graves por si cometidos. E saiu derrotada a visão perversa do processo penal, baseada no abuso da ocultação de provas e na manipulação mediática de processos judiciais.
Tenho também a certeza que há na justiça portuguesa, em todos os operadores judiciários, muitas pessoas que dedicam a sua vida a uma justiça melhor, mais eficaz e mais justa.
No fim de um processo em que há ilegalidades e violação de direitos humanos ninguém vence porque os danos causados são irreparáveis. Mas a sentença de hoje determina que no fim deste processo há um vencedor, um único, a confiança na justiça e a esperança de que ela melhore, amparada no reconhecimento de direitos, liberdades e garantias, na Constituição da República, na Convenção Europeia dos Direitos Humanos, os instrumentos que se impuseram, no fim de tudo, e que impediram que tivesse ficado impune o gravíssimo erro de que fui vitima.
Só hoje voltei verdadeiramente a ser livre. Espero que a perseverança destes quinze anos possa ajudar a que outros não passem por nada idêntico e, sobretudo, se passarem, a terem sempre a esperança de que a liberdade não morre enquanto houver respeito pelos direitos humanos e instituições que garantam e imponham esse respeito.