23.11.15

Surpreendam. Derrotem Cavaco Silva. Depressa.

O Presidente da República só a contragosto nomeará um governo do PS, como já sabíamos. 
Hoje, finalmente, ao pedir clarificações, disse ao povo que está a trabalhar na solução com maioria parlamentar que o PS lhe apresentou. Saudemos esse ponto.
Mas as clarificações solicitadas são pouco mais que a reprodução de um caderno  reivindicativo da direita, infelizmente.
Há muitas formas de a esquerda parlamentar lhe responder. Mas a mais forte e definitiva era um Programa conjunto de governo, abrangente e subscrito pelos partidos que o apoiam. Bem sei que Cavaco lança estas questões porque as suas fontes acham impossível encontrar uma solução com todos os partidos que rebata todos os itens que apresenta.
Só espero - e acredito - que as esquerdas o surpreendam e façam de Cavaco Silva, mais uma vez, o catalisador de um entendimento forte que, talvez, sem os passos que ele deu depois das eleições, fosse bem mais difícil do que é hoje.
E, ao prolongar a crise, Cavaco disse aos portugueses que pensa que toda a estabilidade é necessária, desde que seja a sua.
Se Cavaco Silva é o porta-voz da direita, então há que olhar para ele como adversário que é - e derrotá-lo. Depressa.

12.11.15

A culpa é sempre da Constituição

A direita portuguesa sempre que tem uma pedra no caminho, um problema, ou mesmo um pequeno contratempo, procura uma panaceia e vai sempre dar ao mesmo... rever a Constituição que o PPD, com o PS, o PCP, o MDP e a UDP aprovou. 
Os constituintes sabiam muito mais de sistema democrático, de checks and balances e de governabilidade que os aprendizes de feiticeiro da actual direita todos juntos.
O que a direita que por aí anda ainda não percebeu ou ainda não acredita ser  possível é que podia um dia ser dispensável para fazer uma maioria. 
Ainda que durasse só um dia, esta experiência já teria valido a pena, só por ter demonstrado que todos os deputados sem excepção podem apoiar um governo, se o quiserem e até quererem.

PS. Esta lição também vale para os socialistas que sempre defenderam alianças à esquerda até - e só até - ao dia em que elas se tornaram possíveis.

6.11.15

Para vencer a exclusão dos deficientes

Esta manhã, num seminário da CERCIOEIRAS, pediram-me que falasse de políticas para a integração de deficientes.
Numa sociedade decente esta política não seria necessária, porque os deficientes, como os outros, realizariam o seu potencial e seriam aceites por si e pelos outros com as suas potencialidades e os seus limites. Não haveria exclusão.
No mundo contemporâneo não é assim. As pessoas com deficiência são mais vulneráveis à pobreza, têm menos oportunidades de educação, menos emprego, mais precaridade no emprego e mais desemprego.
Como pode agir-se para vencer esta situação? 
Há três grandes adversários, como dizia o relatório sobre os direitos humanos das pessoas com deficiência apresentado este ano à Assembleia Geral da ONU: o paternalismo, a dependência e a segregação. 
Há, hoje, entre nós, três grandes prioridades políticas para inverter a situação.
A educação é o grande factor de autonomia das pessoas com deficiência. Os mais educados estão mais empregados, são menos pobres e participam mais na vida colectiva. Mas a resposta às necessidades educativas das pessoas com deficiência é um parente (muito) pobre da política educativa.
Os problemas de acessibilidade, ligados à necessidade de conceber o espaço público como amigo das pessoas com deficiência continua a confinar as pessoas com deficiência a mundos limitados. As dificuldades nos transportes, as barreiras arquitectónicas, os obstáculos à mobilidade em geral são grandes inimigos da participação dos deficientes na vida pública. Mas a acessibilidade física, com excepção da eliminação das barreiras arquitectónicas mais óbvias continua a ser um parente (muito) pobre das políticas públicas.
Ser deficientes implica custos acrescidos que se reflectem nos cuidados e serviços necessários, nas tecnologias assistidas necessárias, nos custos de mobilidade, etc mas a protecção social não se foca adequadamente na compensação desses custos, nomeadamente para os deficientes oriundos das classes médias,aumentando muito o risco de pobreza. Mas, a protecção social dos deficientes está Penas centrada nas pessoas já em situação de pobreza ou de falta de rendimentos.
E, finalmente, tudo isto acontece porquê? Porque somos uma sociedade que exclui os deficientes, se mobiliza pouco para garantir que as políticas públicas consigam promover a sua cidadania plena. E este é o primeiro dos problemas a vencer.

3.11.15

Há pressão excessiva sobre o acordo político à esquerda

Anda por aí uma onda de exigência desmedida sobre o primeiro entendimento político entre os partidos de esquerda em quarenta anos de democracia.
Ouço muitos amigos bem intencionados dizer-me "tem que resultar, senão é o fim da esquerda para décadas". Para não falar dos outros que exigem um acordo blindado para a legislatura como espécie de última esperança de que não venha a haver acordo nenhum.
É claro que quero e gostaria que um acordo político de esquerda durasse uma legislatura inteira. Mas não me reconheço nesta exigência acrescida que é uma forma reflexa de complexo de inferioridade do diálogo político à esquerda.
Tomemos os acordos políticos de direita, os únicos que verdadeiramente têm tradição, como primeiro exemplo de comparação. Com maioria absoluta no Parlamento, Francisco Pinto Balsemão não conseguiu levar a primeira AD ao fim da legislatura que começou em 1990. Marcelo Rebelo de Sousa, que formou a Segunda AD com Paulo Portas não conseguiu sequer levá-la até eleições, dissolvendo-a em vésperas de apresentação de listas ao Parlamento Europeu. Pedro Santana Lopes, que recebeu a coligação PSD-CDS de Durão Barroso, conseguiu afundar-se tanto num governo incompetente com Paulo Portas que depois de demitido por Jorge Sampaio levou a direita ao seu pior resultado eleitoral de sempre.
Ou seja, os entendimentos de direita só conseguiram acabar uma legislatura à quarta tentativa.
Para os que preferem o exemplo dos governos liderados do PS, a razão para ser superexigente com a coligação de esquerda também não é óbvia. Mário Soares não conseguiu acabar nenhuma legislatura como Primeiro-ministro. Na primeira caiu às mãos dos seus aliados do CDS e em 1985 por iniciativa da pressa de "ir ao pote" do novo líder do PSD, Cavaco Silva. António Guterres conseguiu acabar uma legislatura, mas caiu desgostoso com um resultado autárquico e incomodado com os orçamentos limianos. E José Sócrates sucumbiu em 2011 à tenás esquerda-direita a propósito do PEC IV. Em seis governos minoritários do PS ou de coligação deste com a direita, em cinco legislaturas, apenas um acabou a legislatura (o de 1995-1999).
Então porque é tão alta a pressão sobre o acordo que aí vem? Porque há muita gente com medo do que mudará se resultar.
Era bom que o governo durasse uma legislatura, mas o que é essencial é que governe bem e com as prioridades acertadas pelo tempo que governe. E, se falhar, que implique aprendizagem suficiente para que, tal como aconteceu com as outras fórmulas políticas, o próximo não repita os erros que se cometam agora.